Democracias sob stress: estado e governo e representação popular – Uma coluna de Ingo Plöger (Português)

Populares invadem símbolos de poderes da democracia. No Brasil no dia 8 de janeiro, assistimos atônitos a uma invasão popular com depredações nas três casas que simbolizam o poder executivo, legislativo e judiciário no Brasil. Anos antes presenciamos na mais antiga democracia das Américas o mesmo acontecer no Capitólio. No Perú hordas infladas avançam de sul a norte com depredações, obstruções de estradas e perdas humanas. E ficamos perplexos tentando entender este fenômeno de radicalização em democracias jovens e adultas mundo afora.

As democracias estão sob um stress enorme e partes da população chegam a fatos de protestos fora do contexto democrático, ferindo princípios de respeito básico.

Buscam-se os causadores, para os colocar novamente dentro do alinhamento da legalidade, mas a pergunta persiste sobre a causa.

Há pouco tempo me caiu às mãos um texto de um estadista brasileiro há pouco falecido, Marco Maciel, que fora parlamentar, governador e vice presidente da República, sobre a representação popular nas democracias e o novo papel da evolução tecnológica, diga-se hoje, digital, no mundo contemporâneo. Colocara os dois sob forte transição nas democracias, o que torna seu pensamento atual.

A democracia contemporânea, empoderou seus cidadãos pelas inovações tecnologias, colocando na mão de cada um deles, um poderoso veiculo de informação, não só para sua comunicação, mas para opinar e influir em seus grupos e comunidades. Enquanto nas democracias, a forma tradicional de informar era através de centros de comunicação em massa como jornais, rádios e televisão entre outros, regulamentadas em leis, por jornalismo, dados e opiniões. Enquanto isso a nova via do empoderamento do cidadão, colocou o “jornalismo individual” na mão de cada um. Fatos ou opinião, verdadeiros ou falsos, não importa, a exponencial exposição se dá pelas redes sociais turbinadas na dita “viralização” da notícia.

Novidade nesta velocidade pelo dispositivo “Tic-Toc” coloca no visor as noticias de maior circulação nacional e internacional e o da preferência pessoal selecionadas por uma Inteligência Artificial deste aplicativo. As preferências se potencializam e formam em brevíssimo tempo opiniões que transpassam as mídias e as instituições de representação política, ou civil. Não há regramento para este “jornalismo popular” conquistado pela tecnologia, confirmado pelas preferencias e expressão de liberdade de opinião e expressão.

Porém o que parece ser uma gigantesca libertação de opiniões, por outro lado se torna também uma libertinagem irresponsável, podendo ferir direitos fundamentais. Brexit e Analítica foram um alerta às democracias, mas também “Fake News” que resultaram em prejuízos irreparáveis à reputação de pessoas empresas e instituições. Para oferecer maior segurança sobre a verdade dos fatos e responsabilidades, os Estados começaram a criar normas e regras para as redes sociais tentando disciplinar os atores da leviandade coletiva. Tênue área entre a liberdade de expressão e o controle de Estado e Governos sobre o que seja “Fake News” ou o que recentemente se denomina a “atentados contra a democracia”. A instigação à violência é uma coisa, a oposição a uma instituição é outra. A criação de instituições que determinem o que é “Fake News” pode lembrar à George Orwell na formação de um “Ministério da Verdade”. O quão perto ou longe estamos neste esforço de um Estado controlador de seus cidadãos até chegar ao “social score”, influindo mais medo do que confiança nas ações humanas em sua sociedade, é aonde se determina a fronteira para as democracias.

Mas como observador arguto das tendencias mundiais, surge incentivado pelas tecnologias o DAO (Descentralized, Autonomous, Organization) pelo Blockchain, uma comunidade organizada por sua própria rede empoderando-se por uma governança própria. Esta forma de organização nasce como uma comunidade com regras que ela mesmo define e colocando propósitos e gestão que se tornam muito eficazes. É uma revolução silenciosa das comunidades civis se organizarem por propósitos. Elas irão se proliferar em velocidades exponenciais, e terão maiores ou menores sucesso pela governança mais aceita ou não. Muitas fracassarão, mas muitas se sobressairão poderosas, inclusivas e ativas.

Sinceramente penso que em 5 a 10 anos os DAOs vão dominar temas e participação popular nacionais ou internacionais de maneira decisiva em nossas sociedades. As democráticas vão ter sucesso, as autocráticas vão sucumbir pela governança não aceita. Se assim for, a pergunta legitima será, o que acontecera com as nossas democracias? Idealisticamente pensando aumentará a forma de uma democracia mais direta onde o cidadão poderá com sua opinião qualificada influenciar a situação e decisões. Provavelmente a representação popular pelo sistema partidário tradicional não mais terá a força de hoje, somente aqueles que por um novo principio de governança e talvez adotando próprios DAO´s irão ser realmente as forças populares que regerão os futuros parlamentos. A governança é que será a distinção entre um e outro. Talvez até algumas DAO´s se tornem partidos sem que queiram ter este propósito, pelo simples fato de sua enorme representatividade.

Se nesta visão idealista existir uma parcela de realismo, como será a transição do atual sistema de enfraquecimento sucessivo dos partidos e o aumento das oposições extraparlamentares?

Certamente haverá uma transição tumultuada onde as partes ou pelo legalismo ou pela experiencia criativa, irão ter embates mais duros. Haverá a necessidade de se construir nas sociedades democráticas as formas de convivência respeitosa com a finalidade de se manter a civilidade no embate das ideias sem ultrapassar os limites da dignidade humana.

Ou seja, os valores que imprimem a democracia a liberdade, o senso de justiça, a participação inclusiva, a diversidade e a busca do bem comum na regra da boa convivência respeitosa, serão os ganhadores na governança. Isso levará à inevitável revisão das funções que devem ser de Estado e de Governo. Colocando como exemplo os temas da Educação, Saúde, Segurança, Relações Internacionais, Energia e Sustentabilidade, são temas geracionais, que ultrapassam a gestão de Governos, e precisam de uma governança mais solida de longo prazo. Talvez estes temas devam ter regramentos de Estado e não deixar que para cada novo Governo eleito que assume o poder, mude as orientações básicas segundo sua ideologia. Na dinâmica deste nosso mundo contemporâneo teríamos por um lado a segurança institucional do Estado e por outro as alternâncias programáticas nos temas de nossas preferencias pelos Governos. A grande força será o da governança democrática por princípios por todos aceitos, quer seja nas nossas democracias, nos DAO´s ou nos nossos grupos de convivência de amigos e família.

Ingo Ploger
Ingo Ploger
Empresario brasileño, miembro de la junta, presidente de CEAL Brasil, mentor at CEAL | + posts

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