Prospecções equivocadas: Por que erramos mais nas previsões? – Uma Coluna de Ingo Plöger (Português)

Se já era difícil realizar previsões antes da pandemia, parece que as prospecções pós-pandemia são muito piores. Não é um hábito muito comum para quem realiza projeções futuras realizar uma autocrítica, revendo criticamente as suas projeções. As projeções realizadas no início e durante a pandemia, anteviam uma redução gigantesca do crescimento mundial e uma recuperação bem mais lenta. O que se constata é que houve, sim, uma redução da atividade econômica forte, porém não desastrosa e uma recuperação muito mais vigorosa de 5,9% maior do que prevista 1). Embora estejamos entrando em um ano em que a pandemia se converterá em uma endemia, vários aspectos ainda não foram previstos nem solucionados. Cito a inflação mundial e regional, a disrupção das cadeias produtivas globais, o endividamento dos países e o aumento das desigualdades. Como ator ativo por muitas décadas de cenários e prospecções, me coloco no centro da autocrítica para identificar alguns erros que continuamente cometemos neste exercício:

  1. Circunstância do observador: o observador de cenários está em um país e em uma circunstância que não necessariamente é a realidade generalizada. Parte de pressupostos de realidades percebidas ao seu redor. A dificuldade empática de não generalizar a sua situação com o macro é muito comum, depende do desprendimento do autor de sua realidade percebida.
  1. Paralisia do mindset: no primeiro momento da crise ou do impacto, a reação defensiva do autor é pensar como sempre fez em suas opções futuras. A pessoa utiliza do ferramental para entender a circunstância, como sempre fez, e tirar conclusões em cima delas, até porque não tem errado muito com elas até então. Mas nunca esta geração passou por uma pandemia, e certamente, as circunstâncias foram diferentes.
  1. Verdades absolutas: são teses que repetidas tantas vezes se tornam paradigmas indiscutíveis. Muitos dos indicadores de medição comparativa foram idealizados por entidades cujos propósitos são definidos por sua atuação específica. Assim um World Economic Fórum mede todos os países da mesma forma, por ele entender que todos devem ser tratados de maneira iguais, ou o FMI mede economias por critérios de sustentabilidade, em função de seu propósito de correção e ajuda, ou a UNCTAD mede investimentos e produtividades monetizando critérios quantitativos, que levam a grandes equívocos, se não forem interpretados na sua circunstância. E assim são repetidos por muitos e muitas vezes. Repare como um exemplo, o índice de abertura econômica de um país pelo WEF, que divide a importação exportação pelo PIB. E aí compara Singapura com EUA, claro Singapura seria a mais aberta das economias e os EUA está no meio de todos os países, sendo um país considerado fechado! É claro que aqui se confundem as cadeias produtivas longas dos EUA onde o denominador é grande.
  1. VUCA: volatilidade, incertezas, complexidades e ambiguidades levam a incertezas que deveriam ser guias a serem seriamente observados, partindo de sinais fracos que se fortalecem no tempo, como um ciclone, e impactam fortemente desenvolvimentos. Eles só são reconhecidos quando todos já constataram o efeito e a velocidade de reação não é mais capaz de oferecer salvaguardas. VUCA é mencionada, mas não sistematicamente seguida, e muito menos analisada.
  1. Medidas ineficazes: sintomas podem ser iguais, mas as causas profundamente distintas. É muito mais fácil identificar sintomas do que causas, e prognosticar medidas que até então deram certo. Mas esta garantia não é mais assegurada. O melhor exemplo é a inflação mundial, após um brutal monetary easing, porém atrelado com um choque de oferta, esta inflação é de oferta e não de demanda. Inflação se combate com juros, esta é a regra geral, porém quando o petróleo dobra de preço, não é o juro que vai derrubá-lo, isto já vimos passar em 1972. Sintomas são iguais, mas as causas são
  1. Novos indicadores: quando o Protocolo de Kyoto fracassou, surgiu o ESG um novo indicador badalado por todos. Para o E temos centenas de indicadores, para o S muito poucos e para o G quase nenhum. Então, para se ter um equilíbrio entre os fatores sustentáveis, novos indicadores se fazem necessários e comumente aceitos. Até então o bem estar de um povo é medido pelo PIB/per capita, e sabemos quão frágil é este indicador, mesmo atrelado ao GINI. Talvez os indicadores da indignação sejam novos e motivadores, como pobreza absoluta, fome e miséria, que levados à inserção econômica poderiam ser drivers de crescimento. Tecnologias Sociais poderiam ser os pressupostos para a qualidade de governança ao melhorar a situação dos menos favorecidos, reduzir custos de governos e aumentar o bem estar.
  1. Seguir correntes: quanto mais se vê difundida uma opinião seguida por muitos, menos arriscado é ter uma opinião diferente e ser contestado. Infelizmente esta é uma prática humana, não só dos que fazem prospecções, mas dos que opinam. Seguir correntes de pensamento é uma coisa, perder o senso crítico é outra. O que menos se observa nas circunstâncias atuais é um senso crítico construtivo de entendimento das diversidades e do VUCA. É claro que não é fácil, mas vale a pena pesquisar as causas para a reflexão dos efeitos. O trabalho virtual aumentou a produtividade, correto, mas nas escolas o índice de retenção e aprendizado caiu. Então o que foi bom para um não é para outro.
  1. Ser pessimista é mais seguro: esta é no mínimo uma verdade para economistas de instituições financeiras, porque, afinal, eles compram o risco, e no mínimo o preço tem que ser justo a um risco maior. Mas brincadeira à parte, quando o pessimista erra, ele tem uma desculpa que é melhor prevenir do que remediar. Já o otimista assume um risco de ver as oportunidades que nem sempre se realizam como ele quer. Hoje todos pedem nas empresas uma matriz de risco, me pergunto porque também não pedem adicionalmente uma matriz de oportunidades? Porque criticar é mais tranquilo do que construir. Porém o pessimista inibe a criatividade e o empreendedorismo, e ao final, a evolução do desenvolvimento sustentável 2).

Provavelmente temos outros equívocos que praticamos com frequência. Acontece que se não dermos ouvidos aos nossos erros, não iremos evoluir na velocidade que podemos. Isto, infelizmente, está ocorrendo na nossa América Latina. As previsões são piores do que os resultados efetivos, as soluções são menos efetivas, e a esperança se reduz na visão do povo. Não é preciso ir longe para percebermos que a razão para o populismo muitas vezes tem suas raízes na falta de objetividade, no excesso opinativo, e na ilusão de receitas fáceis.

Vale a pena rever as previsões de 2021 que fizemos em 2019 e 2020 e aprendermos com os nossos erros. Talvez sejamos melhores do que pensamos e não nos damos conta em função do mindset instalado.

 

Ingo Plöger. Empresário brasileiro, Presidente CEAL Capítulo brasileiro

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